terça-feira, 26 de junho de 2012

Processo Civil - Teoria Geral do Processo Cautelar



O processo cautelar, ao contrário dos processos de conhecimento e de execução, não possui caráter satisfativo, e sim acautelatório. Este é instrumento de garantia dos demais processos, na medida da demora na satisfação do direito por meio do processo de conhecimento seguido da execução.
Por essa natureza, o processo cautelar é sempre dependente do processo principal: o indeferimento da medida cautelar em nada obsta a que a parte intente o processo de conhecimento, no entanto, a improcedência do pedido na ação principal impossibilita a concessão da medida cautelar.
O Código de Processo Civil elenca a partir do artigo 813 as medidas cautelares nominadas, hipótese em que, cabendo uma dessas medidas, a parte não pode interpor provimento cautelar diverso. No entanto, não havendo medida cautelar típica, o requerente poderá invocar o poder geral de cautela do juiz, com as chamadas medidas cautelares inominadas.
Além das condições comuns a qualquer ação, como a possibilidade jurídica do pedido, o interesse processual e a legitimidade das partes, o provimento da medida cautelar ainda requer dois requisitos: o fumus boni iuris e o periculum in mora.
O fumus boni iuris, ou fumaça do bom direito, é a possibilidade da existência concreta do direito afirmado pelo requerente. É obtido através da cognição sumária, com a mera probabilidade do direito. Já o periculum in mora, ou perigo da demora, se baseia no o fundado receio de que o direito do requerente sofra dano irreparável ou de difícil reparação.
As medidas cautelares possuem características peculiares, que as distinguem das demais espécies de provimento jurisdicionais. Alguns desses requisitos são: instrumentalidade, uma vez que o processo cautelar tem por escopo garantir a efetividade do processo do qual depende; provisoriedade, visto que a medida cautelar não se reveste de caráter definitivo; revogabilidade, por se tratar de provimento emergencial, bastando a não existência do fumus boni iuris ou a cessação do periculum in mora para que a medida cautelar seja revogada; autonomia, pois goza de autonomia técnica em relação ao processo principal; e fungibilidade, uma vez que a medida cautelar pode ser substituída, de oficio ou a requerimento da parte, por prestação de caução ou outra garantia menos gravosa para o requerido, desde que seja suficiente para afastar o dano ou repará-lo integralmente.
Tanto o autor quanto o réu do processo principal podem requerer medida cautelar, bastando demonstrar a fumaça do bom direito e o perigo da demora. O critério para fixação da competência para a ação cautelar é funcional, sendo requeridas ao juiz da causa e, sendo preparatórias, ao juiz competente para conhecer da ação principal.
Há a possibilidade, ainda que excepcional, de o juiz determinar a medida cautelar ex officio, isto é, sem audiência das partes, mas apenas quando expressamente autorizado por lei e já houver processo em curso.
O Código contempla um procedimento comum a ser seguido pelas medidas cautelares inominadas: também no processo cautelar, a relação processual se inicia com a petição inicial, que obedecerá aos mesmos requisitos do artigo 282 do Código de Processo Civil.
Seja qual for o procedimento cautelar, o requerido será sempre citado para apresentar resposta no prazo de cinco dias. No entanto, havendo pedido liminar, cabe ao juiz apreciá-lo antes de determinar a citação do requerido e conceder a liminar sem ouvi-lo. Nessa hipótese, pode ainda o magistrado exigir do requerente a prestação de caução real ou fidejussória.
A sentença que concede medida cautelar desafia recurso de apelação, com efeito meramente devolutivo. Como no processo cautelar a sentença não possui efeito declaratório, condenatório ou constitutivo de direito, não se pode falar em coisa julgada material, mas apenas formal.
As medidas cautelares podem ser revogadas ou modificadas a qualquer tempo, bastando o juiz entender não se fazer mais necessária a sua eficácia. O não ajuizamento da ação principal no prazo de 30 dias contados da data da efetivação da medida também faz cessar os efeitos da cautelar.
Todavia, nem sempre extinção do processo torna sem efeito a medida cautelar: quando a sentença de mérito é favorável à parte que obteve a medida, seus efeitos permanecem enquanto forem úteis.
A lei trata ainda da responsabilidade civil do requerente pelos prejuízos causados ao requerido em razão da medida cautelar, quando demonstrada a responsabilidade objetiva e a culpa do agente.
A admissibilidade da intervenção de terceiros no processo cautelar depende do objetivo visado pelo terceiro: oposição e o chamamento ao processo são totalmente incompatíveis com o processo cautelar; a denunciação à lide só é admitida no processo cautelar se cabível no processo principal; e por fim, a assistência, a nomeação à autoria e o recurso de terceiro prejudicado são aceitos no processo cautelar.


Procedimentos Cautelares Específicos

O Código de Processo Civil cuida entre os artigos 813 a 889 de elencar as chamadas medidas cautelares nominadas, que são aquelas que possuem expressa previsão legal.

Arresto

A primeira dessas medidas é o arresto, que é a apreensão de bem com a finalidade de garantir futura execução por quantia certa. Distingue-se da penhora, pois não constitui ato do processo de execução, mas medida acautelatória que antecede esta. Mas tal como a penhora, o arresto apreende e individualiza bens indeterminados sobre os quais incidirão a execução. O alcance do arresto é o limite do valor para satisfação do crédito a ser executado.
Como medida cautelar, o arresto demanda os requisitos do fumus boni iuris e o periculum in mora. No caso do arresto, o fumus boni iuris corresponde ao direito à execução do crédito: para comprovar esse direito, o legitimado para a ação cautelar deverá apresentar o título executivo, ainda que não exigível.
O periculum in mora diz respeito ao receio de fuga ou insolvência do devedor, da ocultação ou dilapidação do seu patrimônio ou qualquer outro artifício para fraudar a execução.
A execução do arresto segue subsidiariamente as regras dos artigos 802 e 803 do CPC. Uma vez concedido, deve ser executado no prazo de trinta dias, sob pena de perda de sua eficácia.
O primeiro efeito do arresto é a afetação do bem apreendido, e a consequente perda da posse direta do requerido sobre este. Os efeitos do arresto cessam com a execução, quando este é então convertido em penhora.

Sequestro

O sequestro é outra medida nominada prevista no Código de Processo Civil. Consiste na apreensão de um bem determinado, objeto de litígio, a fim de assegurar sua entrega ao vencedor da ação, por ocasião da execução. Ao contrário do arresto, o sequestro pode ser preparatório ou incidente, mas assim como aquele, possui os mesmo requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora.
Podem ser objeto de sequestro bens móveis, imóveis e semoventes, sejam penhoráveis ou não. Pessoas não são objeto de sequestro, e sim de depósito, guarda judicial, busca e apreensão ou posse provisória. Enquanto o arresto se fundamenta na prova literal do direito sobre o bem, o sequestro se baseia na dúvida sobre a quem pertence o direito sobre o bem.


Caução

A caução, que pode ser real ou fidejussória, não visa garantir a eficácia de outro processo, mas sim de tutelar direito material, é outra medida cautelar nominada no CPC. Ocorre nas hipóteses de substituição de um procedimento cautelar anteriormente concedido ou como contracautela nas medidas liminares. Nos dois casos, pode ser deferidas de ofício e não dependem de um procedimento cautelar específico.

Busca e Apreensão

A expressão busca e apreensão denomina vários institutos processuais distintos: há a busca e apreensão como meio executivo para entrega de coisa, a busca e apreensão como ação principal, e a busca e apreensão com a finalidade de consolidar a posse e o domínio adquiridos pelo credor fiduciário. Essas espécies não possuem natureza de medida cautelar, uma vez que tratam de ações autônomas, de cunho satisfativo: nos interessa a busca e apreensão cautelar, regulada entre os artigos 839 e 843 do CPC, e que visa garantir a efetividade de outro processo.
A busca e apreensão cautelar é medida residual, nas hipóteses em que não sejam cabíveis arresto ou sequestro. São objeto da busca e apreensão bens móveis ou pessoas, mas nesse segundo caso, somente aquelas que estão sujeitas à guarda, como os menores e os interditos.
Quanto aos demais aspectos, a busca e apreensão não diferencia das outras medidas cautelares, inclusive quanto aos pressupostos específicos da fumaça do bom direito e do perigo da demora. Pode ser deferida liminarmente e em caráter preparatório ou incidente.


Exibição

A medida cautelar de exibição visa expor, apresentar coisa móvel, documento ou escrituração comercial. Não priva o requerido da posse do bem exibido, mas proporciona ao requerente o contato visual com a coisa.
O CPC trata do tema sobre três enfoques: a exibição como objeto de ação autônoma destina-se a satisfazer direito material, protegido em lei ou contrato; a exibição como incidente da fase probatória decorre do dever que têm as partes e terceiros de cooperar com a justiça; e por fim, a exibição como ação cautelar preparatória que serve como instrumento a processo futuro. Nesse último caso, o requerente tem acesso a elementos fáticos que lhe permitirão formar um juízo acerca do direito material que julga possuir, a fim de que possa exercê-lo com maior segurança.
A ação cautelar de exibição só é admitida como preparatória da ação principal, de modo que, uma vez ajuizada a ação principal, desaparece o interesse processual à ação cautelar exibitória.

Produção Antecipada de Provas

A medida cautelar de produção antecipada de provas é cabível sempre antes da propositura da ação principal, quando, em razão da demora em se chegar à fase probatória, houver perigo de perecimento dessa prova. O Código de Processo Civil elenca três meios de prova que admitem a produção antecipada: o interrogatório da parte, a inquirição de testemunhas e o exame pericial.
O deferimento desta medida se subordina à comprovação da plausibilidade do direito a ser discutido no processo principal (fumus boni iuris) e do perigo de impossibilidade de produzir a prova no momento oportuno (periculum in mora).
A antecipação de prova geralmente se faz posterior à citação da parte contrária, mas o juiz pode conceder liminarmente, com ou sem justificação prévia. O deferimento da medida previne a competência do juiz para a ação principal.
Se a prova a ser produzida for oral o juiz, ao despachar a inicial, designará audiência para inquisição da testemunha ou interrogatório da parte. Tratando-se de exame pericial, no despacho da inicial nomeará perito, determinando a citação do réu para, em cinco dias, indicar seu assistente técnico.

Alimentos Provisionais

A medida cautelar de alimentos provisionais consiste no pagamento, por parte do requerido, de importância destinada a suprir as necessidades do requerente. Pode ser concedida no curso da ação principal, como antecipação do provimento jurisdicional pleiteado pela parte, hipótese em que dispensará a instauração de processo cautelar. Geralmente é proposta nas ações de separação judicial, anulação de casamento, ações de alimentos e investigação de paternidade.
Há circunstâncias em que a parte pode necessitar dos alimentos provisionais antes da propositura da ação de conhecimento, onde será cabível pleitear ação cautelar, desde que demonstrados suficientemente o fumus boni iuris e o periculum in mora.

Arrolamento de Bens

O arrolamento de bens é medida cautelar que tem por finalidade conservar bens sobre os quais incide o interesse do requerente. Tal conservação se dá com a listagem dos bens e seu depósito, que pode recair sobre a pessoa do possuidor.
Distingue-se do arresto e do sequestro, uma vez que ao contrário daqueles, o arrolamento recai sobre bens indeterminados, não litigiosos, com o exclusivo intuito de conservá-los, até a partilha ou a resolução da demanda relacionada a eles.
Para ser concedida a medida, é necessário que a parte demonstre o interesse na conservação dos bens (fumus boni iuris) e o fundado receio de extravio ou dissipação (periculum in mora): o interesse do requerente pode resultar de direito já constituído ou que deva ser declarado através de ação própria.

Justificação

A justificação é a medida de coleta de depoimentos de testemunhas, sem caráter contencioso, com a finalidade de reuni-los para servir ou não de prova em processo contencioso. Por se tratar de procedimento absolutamente autônomo, seu deferimento não reclama a existência de periculum in mora, bastando ao interessado demonstrar seu interesse.
É necessária a citação dos interessados e, por se tratar de procedimento de jurisdição voluntária, parte da doutrina entende também ser indispensável a intervenção do Ministério Público. Não há oportunidade para defesa, cabendo ao interessado apenas acompanhar a justificação.

Protestos, Notificações e Interpelações

Os protestos, notificações e interpelações são manifestações formais de comunicação da vontade, com o intuito de prevenir responsabilidades ou prover a conservação ou ressalva de direito. Assim como a justificação, não possuem natureza cautelar, uma vez que não prestam cautela a processo algum, tratando-se, na verdade, de procedimentos de jurisdição voluntária.
Homologação do Penhor Legal

Homologação do penhor legal consiste na medida cautelar que visa completar o procedimento do penhor, a requerimento da parte, para que o devedor seja citado para pagar o que é devido ou apresentar defesa.
Tendo ocorrido a homologação do penhor, serão os autos entregues ao requerente; não sendo homologado, o objeto será entregue ao devedor. As hipóteses em que se admite o penhor legal estão elencadas no artigo 1467 do Código Civil.

Posse em Nome do Nascituro

A medida cautelar de posse em nome do nascituro tem por finalidade garantir o direito do nascituro, respeitando a disposição do artigo 2º do Código Civil, que põe a salvo os direitos do nascituro. Na hipótese da mãe necessitar garantir os direitos do filho nascituro, esta requererá ao juiz que, após ouvido o Ministério Público, processará o feito.
A petição será acompanhada da certidão de óbito de quem o nascituro é sucessor. É dispensada a aceitação por parte dos outros herdeiros do falecido, de modo a não haver prejuízos aos direitos do nascituro. O juiz então declarará a mãe investida na posse dos bens destinados ao nascituro.

Atentado

Denomina-se atentado a medida cautelar que tem por fim reestabelecer o estado de fato da lide, motivada por ato de uma das partes no curso do processo. O CPC elenca três hipóteses que ensejam o ajuizamento da ação cautelar de atentado: a violação da penhora, arresto, sequestro e imissão de posse; o prosseguimento em obra embargada; e a prática de qualquer outra inovação ilegal.
A ação de atentado será processada e julgada pelo juiz que conheceu originariamente da causa principal, ainda que esta se encontre no tribunal. A sentença que julgar procedente a ação ordenará o restabelecimento do estado anterior, e poderá condenar o réu a ressarcir à parte lesada às perdas e danos.

Protesto e Apreensão de Títulos

Denomina-se protesto a medida extrajudicial cuja finalidade é garantir ou acautelar direitos cambiários. Não se trata propriamente de medida cautelar, porquanto não possui natureza judicial.
Dá-se com a apresentação do título para protesto ao oficial que, após verificar a validade formal do título, manda intimar o devedor para que este efetive o pagamento no prazo estipulado por lei.
A intervenção judicial se dá apenas quando o oficial opõe dúvidas ou dificuldades à tomada do protesto ou à entrega do respectivo instrumento. Nessa hipótese, pode o interessado requerer ao juiz que, depois de ouvir o oficial, determine o protesto.
Por fim, o fato de o Código listar esse rol de medidas específicas não veda a concessão de outras providências inominadas, com base no poder geral de cautela concedido ao juiz pelo artigo 798.



Referências

MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de Direito Processual Civil - Vol. 3. Misael Montenegro Filho. 6ª Ed. São Paulo: Atlas, 2010.
NUNES, Epídio Donizetti. Curso Didático de Direito Processual Civil. Epídio Donizetti Nunes. 13ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.

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